Calçada Portuguesa

Chamo-me passeio
Faço parte da História da cidade
Rasgaram-me em terra batida
Fui lamaçal com o frio e as chuvas
Poeirento ao calor e ao vento
Até se cansarem dos meus caprichos
Vestiram-me mais tarde com cubos de granito
E fui brindado na despedida do século dezanove
Com elegantes e distintos candeeiros a gás.
Perdi imponência e na minha decadência
Convivi décadas com mulheres da vida
Encostadas ao correr das minhas fachadas
Nos terraços que me animaram os serões
Senti o fel e o babel dos marinheiros ébrios
Presenciei brigas e tragédias de navalhas
Cenas de ciúmes a mancharem a minha reputação
Limparam-me de novo a face
E a perícia e o suor de mestres cantoneiros
Com arte e carinho imortalizaram-me,
Com muito gosto,
Em calçada portuguesa